7.2.02

Blair e Bush entre o Nobel e o belicismo

Venda de armas à África arranha indicação para Academia

(Publicada originalmente no JB)

Comandantes de um tempo de guerra, o americano George Bush e o britânico Tony Blair foram indicados para o prêmio Nobel da paz. A indicação veio de um membro da ultra-direita do governo norueguês, Harald Tom Nesvik. O parlamentar do Partido do Progresso afirma que os dois atendem perfeitamente o critério criado por Alfred Nobel, determinando que o vencedor deve ter feito ''o melhor trabalho pela fraternidade das nações, pela abolição ou redução dos Exércitos e pela promoção da paz''. Segundo Nesvik, ''às vezes você tem de usar de força para garantir a paz'', numa referência à chuva de bombas contra os terroristas nas montanhas do Afeganistão.

O anúncio soa ainda mais estranho nessa semana, quando Bush propôs o maior orçamento militar desde a Guerra Fria e Blair, a caminho da África num safári político, é alvejado em casa e no exterior pela postura dúbia de seu governo quando desenvolvimento e armas se misturam.

Afinal, como explicar que um pacifista tenha autorizado apenas nos últimos três anos um aumento de 400% nas vendas de armamentos para governos africanos, continente onde há mais guerras civis que se possa contar, ditaduras a granel e miséria sobrando? Embora as vendas não pertençam ao governo inglês, mas a empresas particulares, Downing Street tem de dar seu visto em cada uma delas.

Retórica - O problema seria menor se Blair evitasse declarações como as feitas na última convenção do Partido Trabalhista - quando prometeu ''socorrer os famintos, os miseráveis, os ignorantes, os que passam necessidade e vivem na imundície'' - e admitisse abertamente que seu país vende cada vez mais armas para o continente africano, que ele mesmo define como ''uma cicatriz na consciência do mundo''. Estaria apenas tomando a atitude típica de liberal, longe de ser o pior pecado no país.

Em 1999, as vendas passaram US$ 70 milhões, em 2000 saltaram para US$ 176 milhões e no ano passado chegaram a US$ 280 milhões, segundo o Campaign Against Arms Trade, que luta para impedir a venda de armas. Boa parte desse bolo é referente à venda de caças leves de ataque Hawk para a África do Sul, mas o acordo que está levantando mais polêmica - não só entre ONGs que discordam da política do governo, mas entre os lordes e o público - é mesmo o caso da Tanzânia.

Um contrato no valor de US$ 40 milhões foi fechado entre o governo do país africano e a BAE Systems para a construção de um sofisticado sistema de radares militares. Apesar da pobreza do país, da desaprovação explícita do Banco Mundial e de regras da União Européia que, se adotadas, poderiam minar o negócio, Blair aprovou a venda. ''A coisa toda fede'', disse um funcionário do governo ao diário The Guardian.

Em tempo: a Tanzânia têm oito aviões militares e uma renda per capita de US$ 500.

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