19.8.09

Aos visitantes

Atenção: aí vem um daqueles posts culpados-mas-espertos, em que o blogueiro admite que não está tendo tempo de atualizar o blog, muito trabalho, etc, etc, mas se sai com uma piadinha que mantém o interesse do visitante circunstancial. Você já leu em outros lugares.

Agora acaba de ler aqui.

Em tempo: As matérias publicadas por aí e eventuais notícias de Personal Che continuam, ok?

18.8.09

Os com-jaleco

Hippie colombiano anda alinhado



(Essa esquina foi publicada originalmente na piauí 35 e é assinada em compadrio com a cidadã paulisto-bogotana Camila Moraes)

Numa recente terça-feira nublada, Alejandro - um hippie colombiano que acha meio insólito "isso de dar o sobrenome" (e por isso não dá) - estava sentado na calçada diante da matéria-prima de seu labor: contas, miçangas, palhinhas. Foi quando apareceu um colega seu aflito, sacudindo um jornal (gratuito, como convém) no ar.

Uma das manchetes espalhou apreensão naquele canto de praça em que a década de 60 parecia imortal: "Hippies terão uniforme." "O que essa mulher vai fazer a gente usar?", pensou o colombiano do alto dos seus suspeitos, mas declarados, 42 anos de idade. (Suas rugas remetem mais à quadra dos 60, ainda que a disposição geral seja de uns trinta e poucos.)

A mulher é Blanca Inés Durán, engenheira concursada que desde o ano passado se tornou subprefeita de Chapinero, algo como a Rive Gauche ou o East Side de Bogotá: o bairro dos boêmios e artistas, talvez um dos quarteirões mais tolerantes de toda a Colômbia.

O espanto dos alternativos é que Blanca sempre foi considerada "um deles". Não necessariamente "deles", os hippies, mas "deles", os diferentes. Ali estava, afinal, uma lésbica militante que só aceitara disputar o cargo ao saber que dois ou três candidatos conservadores queriam fechar os diversos bares gays da região. Os mesmos bares - ela própria conta - onde afogara as mágoas do fim de seu primeiro casamento com uma mulher.

A surpresa com o viés autoritário da medida não se restringiu à turma da miçanga. A imprensa colombiana fez troça da iniciativa, anunciando a distribuição de escovas e tubos de laquê num novo programa, "Hippie Limpo e Bem Penteado".

Quando a poeira baixou, vieram à tona os principais pontos da medida. Se a palavra "uniforme" havia causado choques apopléticos nos cabeludos, foi quase fatal a notícia de que seriam obrigados a portar um "carnê". Para domar a ansiedade, muito se fumou, e de tudo. Teriam eles de pagar mensalidade para trabalhar na rua? Não, o carnê se tornaria apenas uma espécie de carteira de identidade. Pela qual teriam de pagar? Também não.

Durou pouco o alívio. O pessoal logo se deu conta de que portar identificação equivaleria a uma sentença de morte para quem vive do comércio de badulaques e outras mercadorias nem sempre aprovadas pelo Ministério da Saúde.

Com o sociologuês tinindo, Blanca explica: "A idéia é que só os participantes dos nossos projetos de reinserção econômica recebam os carnês. O que queremos é justamente que as pessoas encontrem projetos produtivos e deixem sua situação de rua."

Como a frase não parece significar nada, é o caso de perguntar coisas mais concretas. E a história dos uniformes? "Não se trata exatamente de uniformes, mas de jalecos. Precisamos identificar quem tem carnê e quem não tem, compreende?" Durante quanto tempo os sem-jaleco ainda poderão vender na rua? "Em pouco mais de um ano todos os ambulantes estarão uniformizados. Vamos fazer batidas frequentes para garantir que isso seja cumprido." Ou seja: quem estiver na rua por falta de opção poderá contar com os programas do governo. Quem estiver por opção, que vá atrás de outras praças para exercer o desbunde.

Um projeto que mexe com a identidade dos hippies metendo-os em uniformes - vá lá, jalecos - não poderia ter chegado em momento mais crítico, justo quando eles próprios nutrem dúvidas sobre quem exatamente são.

"Não existe isso de ser hippie e ponto. Tem vários tipos: hippie ermitão, hippie andarilho, hippie caminhante...", explica Alejandro. Qual seria a diferença entre esses dois últimos? "Bom, o andarilho passa a vida andando, mas não faz nada. Já o caminhante é artesão, se movimenta, vende suas coisas num lado e no outro. Eu já fui hippie andarilho. Hoje acho que sou caminhante, um artesão comum e nada mais." Ele fala com os olhos meio perdidos na fumaça. Seu corpo traz tatuagens desbotadas e o cabelo está preso por uma faixa apache.

Ao lado de Alejo está Rodolfo, outro que também não declina o sobrenome. Como trabalha com figuras de arame, pode-se supor que seja hippie caminhante. Essa história de jaleco e carnê o deixou muito desgostoso. Está ponderando se não seria hora de correr mundo de novo, como fez outras vezes. Já viveu na Europa, de país em país, vendendo pulseirinha de palha por 8 euros. Voltou "bem de vida", se deu até ao luxo de trazer para a Colômbia uma cadelinha cocker - "Lindinha", ele diz.

Seu rumo agora deve ser outro: Venezuela. "Dizem que lá o Chávez apóia os vendedores de rua. Parece que dá até mesada", comenta, torcendo com um alicate as pétalas de arame de uma flor. A revolução bolivariana está prestes a virar odara.

"Hippie tem que viver nas comunidades, senão, não é hippie. Sabe Woodstock? Pois é, ser hippie é aquilo", Alejo sintetiza. "Ter liberdade, fazer amor sem preocupação, ficar pelado num rio..." Donde a consternação geral: ficar pelado em rio é muito difícil de jaleco. A subprefeita Blanca Inés Durán não está compreendendo esse lado.

Distribuição alternativa

(publicado na piauí 35)

Pedro - se é que ele se chama Pedro - já lançou dezenas de filmes brasileiros no mercado. Graças a ele, seja no Japão, no Canadá, na Romênia ou no Tocantins, cinéfilos tiveram acesso a uma enorme variedade de obras, desde comédias da pornochanchada a documentários papo cabeça vistos por uma meia dúzia de gatos pingados. Ainda assim, Pedro não é famoso; a imprensa especializada ignora seu trabalho. Até onde se sabe, ele não compareceu (porque nem o convidaram) à posse da nova diretoria da Agência Nacional do Cinema, um beija-mão que reuniu o "quem é alguém" do ramo, em junho.

Produtores ciosos, auteurs soberbos, distribuidores neurastênicos, tremei! Neste exato momento, Pedr1nho - com o número 1 no lugar do i - pode estar jogando suas obras na internet, para gáudio dos internautas sedentos por filmes nacionais gratuitos. Pedr1nho é provavelmente - difícil ter certeza, dado que a classe pirata não tem sindicato - o maior fornecedor de audiovisual brasileiro não contabilizável na rede.

O fruto de seu esforço pode ser visto nos principais sites de compartilhamento gratuito de arquivos, como o The Pirate Bay, o Mininova e o Demonoid, que escapam da perseguição aos infratores de direitos autorais materializando-se a cada par de meses em novo servidor, com frequência sediado em outro país.

Pedro faz questão de não ser confundido com um camelô que vende dvds arrasa-quarteirão hollywoodianos, -shows de pagode e música sertaneja. Ele tem, com o perdão da palavra, uma griffe. O freguês que recorre aos seus serviços sabe exatamente que nicho ele explora: filme nacional. É pegar ou largar. No catálogo há também documentários de surfe, shows de rock e animações legendadas. (Pedro não quis explicar se é surfista ou tem filhos.)

A carreira de pirata desse administrador de empresas de trinta e poucos anos começou em 2004, quando ele pôs na rede o arquivo de Dois Perdidos numa Noite Suja, filme de José Joffily baseado na peça homônima de Plínio Marcos. Pouco mais de 40 mil espectadores pagaram ingresso para ver a fita no cinema, resultado considerado modesto. "Eu achava que ninguém ia se interessar, mas acabou que muita gente baixou e começou a me pedir para lançar outras coisas do Brasil", ele conta. "A partir daí, não parei mais."

A sacada foi incluir as palavras "Brazilian Cinema" no nome do arquivo. Assim, para assistir a um filme brasileiro, não é preciso buscar nenhum título específico. Basta digitar as duas palavras no Google e acrescentar a palavra torrent, nome de um tipo de sistema que permite compartilhar qualquer conteúdo com Deus e o mundo. Em frações de segundo, uma variada videoteca da produção brasileira pós-retomada se abre diante dos olhos do cinéfilo deslumbrado. O que se vê são páginas e mais páginas que oferecem, por exemplo, Feliz Natal, de Selton Mello, Doutores da Alegria, de Mara Mourão, O Aborto dos Outros, de Carla Gallo, Querô, de Carlos Cortez, Cão sem Dono, de Beto Brant, e Baixio das Bestas, de Claudio Assis.

Pedr1nho já contrabandeou mais de 150 filmes para a rede. A oferta pode ser bem direcionada, mas a clientela é heterogênea. Há o grupo dos que reclamam do preço de um dvd. Outros vivem no interior, em cidades onde a oferta de filmes nacionais nas salas de exibição é especialmente anêmica. Um terceiro grupo, numeroso e especialmente agradecido, se compõe de brasileiros que moram no exterior e dependem da web para ver filmes nacionais. E há, por fim, um número significativo de estrangeiros que se interessam pela produção brazileira. "Um pessoal da Bulgária já me escreveu algumas vezes, dizendo que montaram uma 'Brazilian night' em Sófia com os filmes que eu pus na rede", se empolga o bucaneiro. "Eles baixam as legendas em inglês e traduzem para o búlgaro. Dizem que é um sucesso." É mais do que Celso Amorim já fez pelas relações Brasil-Bulgária.

Em 2005, Pedr1nho se juntou a nomes agora totêmicos do "udigrúdi internético" do país - gente que se escondia atrás de apelidos esdrúxulos como 614uc0, ToToH ou huricane_brazil - para fundar o Compartilhando, um dos primeiros sites brasileiros a oferecer de graça arquivos não só de filmes, mas também de videogames, músicas e livros. O site foi de vento em popa durante dois anos, até a Polícia Federal avisar ao huricane_brazil virtual que sua versão de carne e osso podia acabar na cadeia, caso ele insistisse na pirataria a torto e a direito.

O fato de ter a polícia no calcanhar não quer dizer que piratas como -Pedr1nho não tenham um código de ética, ainda que peculiar. "Outro dia caiu na minha mão uma cópia do l.a.p.a", o documentário de Cavi Borges e Emílio Domingos sobre o mundo do hip-hop no Rio de Janeiro. "Não copiei", diz ele. É que os produtores estão tentando distribuir o filme pelas comunidades pobres do Rio, e Pedr1nho, como Robin Hood, não gosta de tirar o pão de quem tem poucos recursos.

Exemplo contrário é o filme Estômago, de Marcos Jorge. Pedr1nho ficou orgulhoso em pirateá-lo. "Um baita filme, cara. E foi muito mal explorado comercialmente no Brasil. Eu quase não consegui ver. Se o diretor lançasse na rede e as pessoas pudessem pagar o que quisessem para assistir, eu não teria pirateado", diz ele, propondo um business model alternativo para o cinema nacional. É esse o modelo adotado, por exemplo, pela banda inglesa Radiohead para distribuir seu disco In Rainbows. "O Estômago tinha que ter representado a gente no Oscar, em vez daquele filme horroroso, o Última Parada 174."

Pedr1nho garante que não se vê como um justiceiro audiovisual, mas, como ates-ta sua opinião sobre L.A.P.A. e Última -Parada, há um juízo moral, estético, econômico - político, na verdade -, que o faz decidir se vai ou não gastar as onze horas necessárias para transferir um dvd para a rede. "Eu já coloquei de tudo. Agora, só o que gosto." Ele cita um exemplo: "Pirateei Irma Vap: o Retorno." O filme, dirigido por Carla Camurati, não mereceu uma recepção particularmente festiva, nem por parte do público, nem por parte da crítica. "Hoje em dia eu jamais lançaria isso", diz Pedr1nho. No Brasil, todo mundo é crítico de cinema. Até os piratas.

22.7.09

Arte


Não há outro jeito de definir a personalidade cheia de cacoetes e manias de Gay Talese: artista é assim. Em caso de dúvida, basta ver esse guia que ele fez para se orientar na feitura de sua obra-prima, Frank Sinatra está gripado, publicado na Esquire em 1966. É sempre bom ver o quanto um método depende de boas mãos para render.

15.7.09

Onze casinhas engraçadas

De frente para o mar, sem janelas

(publicado originalmente na piauí 34)


A residência de Hugo Simas de Carvalho Filho parece ter saído daquela cançãozinha infantil de Vinicius de Moraes: "Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada" - ou melhor, teto há, mas é um passeio público. O contratempo não impediu Carvalho de ter telefone fixo, água corrente e ar-condicionado, além de uma das vistas mais bonitas do Rio de Janeiro - isto é, embora a casa não tenha janelas.

Carvalho - conhecido como Cabo, sua patente quando foi dispensado do Exército - mora no airoso bairro da Urca, ao lado do segundo marco mais importante do bairro (o primeiro é o Pão de Açúcar). Seu vizinho é o célebre Cassino da Urca, um prédio de estilo eclético que, entre 1922 e 1933, abrigou o Hotel Balneário, depois o Cassino e mais tarde a TV Tupi, entre 1953 e 1979, quando então foi entregue às traças. No momento, o prédio está sendo reformado pelo Istituto Europeo di Design, o ied, para abrigar a filial carioca da instituição, fundada em Milão.

Não se acha sua casa logo de cara. Primeiro, amarrado numa frondosa amendoeira, se avista um varal de roupas, depois uma mesa com algumas cadeiras de plástico e por fim um caiaque ver-melho tostado pelo sol. É o quintal. O Cabo, um homem corpulento de 65 anos, mora há mais de três décadas ali.

"Ali" significa de frente para a Baía de Guanabara, debaixo da calçada eleva-da que circunda a Praia da Urca. É por isso que, ao acordar, o Cabo apenas cruza uma breve faixa de areia e já está no mar para cumprir seus 5 quilômetros diários de natação. Originalmente havia ali "cabines de vestir", construídas pelo Hotel Balneário para que os hóspedes pudessem recatadamente vestir suas roupas de banho e nadar nas águas ainda límpidas da baía. Com o passar dos anos, entretanto, a pudicícia se tornou démodé e as cabines acabaram abandonadas. Isto é, até a chegada do Cabo.

Seu primeiro contato com o bairro foi no final dos anos 60, já quando ele trabalhava como salva-vidas. Entre um salvamento e outro - o que naquele espelho d'água devia acontecer a cada solstício de inverno -, investigou o território. Todas as cabines estavam vazias e caindo aos pedaços. Ele levou dez anos até decidir se mudar. Primeiro instalou um catre numa cabine, depois um fogareiro a gás na seguinte, até que começou a pôr abaixo as paredes entre elas para criar cômodos mais espaçosos. "Que é que eu ia fazer? Eu fui... tomando, né?", diz ele, demorando a escolher o verbo. "Faz muito tempo, isso."

Hoje a casa equivale a onze cabines. As paredes foram cobertas de ladrilhos, "para evitar a umidade"; a cor, azul-bebê, foi escolhida - curiosamente - para "dar a impressão de mais espaço". É de fato apertado, mas há um quarto para ele e a mulher, outro para o filho, de 8 anos, e uma sala-cozinha com fogão, duas geladeiras e outras comodidades do-més-ticas. Carvalho se apressa em mostrar o relógio de luz e uma conta, além de colar o gancho do telefone no ouvido do vi-si-tan-te para que ouça a linha. "Aqui não tem gato, não. Eu pedi e eles instalaram, ué. Como todo mundo."

Há certa justiça poética em sua história. Um dia o Cabo deixou a vila de pescadores onde nasceu, na região de Niterói, para trabalhar no Rio. A casa que tinha lá passou anos fechada, até que as Forças Armadas anexaram o terreno ao Forte do Imbuí e todas as casas sem uso (como a dele) foram demolidas. O Cabo não associa a invasão da Urca a esse episódio, mas confessa que de vez em quando pega o caiaque e cruza a Baía de Guanabara até a praia onde morou: "E eu não posso descer na areia, dá para acreditar?"

O Cabo acredita na instituição da propriedade privada: "Não fosse eu para vigiar o prédio do cassino, isso aqui tinha virado um paiol de vagabundos", garante. Forasteiros que tentassem pernoitar ou se drogar ali eram suma-riamente escorraçados.

Ele conta ter recebido com alegria a notícia de que o prédio seria refor-ma-do - mas o ied não gostou de descobrir a vizinhança. No ano passado um fun-cionário interpelou o Cabo e, educa-da-mente, disse que ele teria de sair dali.

A questão ainda é nebulosa. A es-cri-tura do prédio não estipula com exatidão se as cabines fazem parte ou não do conjunto. O Cabo, por sua vez, tem algumas taxas pagas, mas nenhum documento de posse. O complexo cabineiro habita um vácuo jurídico.

Está em curso uma polêmica fundiária que divide o bairro, mas, é bom que se diga, o Cabo não está no centro dela. Os olhos se voltam para o ied , acusado de se instalar ali sem avaliar impactos sobre trânsito, segurança e rede de esgoto. A associação de moradores encheu as ruas de cartazes bradando "ied não". A obra, cujo custo total se estima em 17 milhões de reais, está no fim da primeira fase. Há algumas semanas, a Câmara de Vereadores decidiu por unanimidade tombar o imóvel, destinando-o ao uso cultural, decisão recebida como um nocaute pela turma do não.

Inspirado pela reação dos habitantes locais, o Cabo decidiu levar seu caso a instâncias extraordinárias. "O prefeito nem me deixa chegar perto", ele diz, mas com Lula acha mais fácil. Já conseguiu até entregar três cartas ao chefe da nação, em diferentes eventos no Rio. "Sempre fiz de um jeito muito discreto", sublinha.

O Cabo pediu que o presidente falasse com os militares para lhe permitirem voltar a morar com a parentela na antiga vila de pescadores. Recebeu três respostas com o timbre do Palácio do Planalto: entendiam seu pleito, mas não havia o que pudessem fazer. A idéia, então, é ser mais chamativo da próxima vez que Lula estiver na cidade. "Vou beijar o pé dele para vocês da imprensa tirarem foto", avisa. "Aí eu quero ver."

25.6.09

Olá Bagdá

Uma amiga minha me escreve agora há pouco:

"Cheguei a Bagdá num belo passeio de helicóptero pela manhã para escrever algo sobre o Jaish al-Naqshbandia [explicação minha: um grupo de milicianos sunitas que eram parte do regime de Saddam]. Alguns ataques sectários horríveis aqui. Um caminhão de legumes explodiu em Sadr City ontem e uma bomba em outro subúrbio xiita hoje. Até agora nenhuma reação, mas queria ver se isso muda depois da debandada americana marcada pra 30 de junho. (...) Você viu a matéria do Guardian sobre as cultivos legais de ópio?"
Seu endereço anterior era em Cabul, daí a intimidade com que trata as plantações de papoula. Faz alguns anos que ela deriva de guerra em guerra. Logo depois que nos conhecemos foi passar uma semana com traficantes da Cidade de Deus. Não tenho coragem de lhe dizer o óbvio, que pouca gente sem nada para ganhar - dinheiro, liderança, etc - tem qualquer interesse nessa guerra estúpida. Só escrevo isso aqui na fé de que seu pouco português tenha sido esquecido.

Johanna, magra como um graveto, que de vez em quando pintava as unhas dos pés de vermelho.

20.6.09

Chenouras


Eu sei que já postei coisas demais sobre Che aqui nesse blog, mas essa é irresistível. Depois de criticar Barack Obama por matar uma mosca durante uma entrevista, a ONG americana PETA ("gente pelo tratamento ético dos animais") lançará uma campanha com uma modelo imitando a pose clássica do Che, mas vestindo apenas uma calça camuflada, uma boina bordô e uma bandoleira carregada de... cenouras.

Até aí (quase) nada demais. Mas a moçoila aí em cima tem 24 anos, se chama Lydia, é vegetariana e –tcha-rã! – neta de Che. O making-of da sessão de fotos está aqui.

A família tem alguns membros bastante públicos. A viúva do segundo casamento, Aleida March, acaba de lançar livro sobre a breve vida em comum que tiveram. Aleida e Camilo, dois de seus filhos, ela médica, ele documentarista, são entusiasmados apoiadores da esquerda latino-americana. Canek, neto do primeiro casamento de Che, é designer, roqueiro e vez por outra critica o regime cubano. Vive, como não é de se estranhar, entre Paris e Barcelona. Não sei de quem Lydia é filha, mas é um tanto estranho que a) seja argentina e b) more nos EUA.

Sarcástico que era, vô Che deve estar sorrindo.

10.6.09

O anjo azul


Taí um filme – de muitos – que tinha vergonha por nunca ter visto. Me pareceu ótimo melodrama. Todas as peças são muito bem encontradas, modernas e sutis até. Que dizer do primeiro palhaço, cujos olhares só se pode entender à medida que a trama se desenrola? Shadowing da melhor qualidade. Emmil Jannings, o Professor Rath, tem uma atuação soberba no final, estupenda, um cocoricó de arruinar o coração, em cima do palco.

Houve também uma defasagem de expectativas minhas. De alguma forma, fiquei positivamente surpreso com Marlene Dietrich. Não me entenda mal: é linda e coisa e tal, mas a imagem que sempre tive dela era de uma mulher dura, de rosto anguloso. Se você quiser, a encarnação do puritanismo. Mas no filme ela é uma atris de vaudeville, putita, manipuladora, que avança se mostrando fácil. Basicamente alguém que zomba do puritanismo.

Me parece melhor.

6.6.09

Desde Berlim, hace tiempo



Segue uma breve entrevista que dei ao bacana programa Trans, sobre arte contemporânea (sim, me consideraram autor de tal coisa), quando estava na oficina de roteiro do Festival de Berlim. Começa lá pelo terceiro minuto.

Relevem a cara de sono e o tom lacônico. Nevava, era cedo, já estava no oitavo dia de festival e a cerveja alemã tende a ser boa. Talvez explique também o fato de que eu me esqueci completamente de ter dado essa entrevista.

Ah, os festivais...

3.6.09

A paixão de Joana D'arc



Há tempos penso em propor a mi mesmo um programa mínimo de educação em história do cinema. Pois vou usar o blog para me pressionar a romper a preguiça e, sempre que possível, ver um "filme importante" e escrever duas ou três ideias sobre ele aqui sem pesquisar nada e refletindo apenas um pouco. A maior parte dos filmes vem da minha coleção, bastante boa, que por sua vez devo à coleção ótima do cineasta colombiano Rubén Mendoza. Não fosse ele e suas dezenas de Criterion Collections e outros selos, esse projeto seria mais difícil, vizinho do irrealizado.

• • •

A paixão de Joana D'arc, de Carl Theodor Dreyer. Não há outro critério para avaliar a montagem além do da arte. Nada é informativo, tudo obedece um fluxo dos sensos. Consegue transportar o expectador para dentro da ação sem mímese alguma, mas como um livro: há muito espaço para imaginar o fora-de-quadro e expressões apenas suficientes para completar cantos escuros das personagens. Trabalho de casting impecável tanto dos algozes quanto de Joana que, segundo li, era uma atriz teatral mais especializada em comédias. É de uma beleza santa, por vezes, embora os lábios e olhos apontem também uma sensualidade que talvez explique um pouco do carisma da própria Joana como ator histórico. Trabalho de fotografia ousado para a época pelo puco que sei, cheio de tilts e dollies pouco usuais mesmo hoje. Cheiro de cinema sendo descoberto. Teria sido uma pena o filme ter se perdido para sempre, o que quase aconteceu: julgava-se perdido para o fogo há décadas até que em 1985 se encontrou uma cópia num hospício norueguês. Anedota curiosa. Parece muito mais ousado que Vampyr, filme seguinte de Dreyer.

2.6.09

Nay, nay, nay




Taxman tocada no Japão? Clipezinho riponga de "Here comes the sun?"? "Unison bonus"!?!?!?

Esse é o clipe de lançamento do videogame dos Beatles. Com ele, em teoria, qualquer um vai poder tocar igual aos fab four.

Não sei se amaldiçôo ou compro um.

28.5.09

Finalmente, POA




Uma das grandes tristezas durante o lançamento oficial do Personal Che foi que não encontramos um espaço legal disponível pra mostrar o filme em Porto Alegre. A terra é suficientemente próxima a) da Argentina e b) da esquerda pra receber com algum calor o filme. O jejum indevido vai acabar semana que vem com uma pequena mostra de documentários que o Cine Santander (Av. Sete de Setembro, 1028) vai organizar lá. Além do Che tem muita coisa legal. Os horários:

• 3 e 4 de junho (4ª e 5ª)
15h Brizola - Tempos de luta, de Tabajara Ruas
17h Café dos maestros, de Miguel Kohan
19h Personal Che, de Douglas Duarte e Adriana Mariño

• 5 e 6 de junho (6ª e sábado)
15h La quimera de los héroes, de Daniel Rosenfeld
17h Contratempo, de Malu Mader e Mini Kert
19h Brizola - Tempos de luta

• 7 de junho (domingo)
15h Personal Che
17h Café dos maestros
19h Curtas de Gualberto Ferrari


PS: A foto do post foi tirada exatamente há três anos em Hong Kong, quando eu e Adriana Mariño estávamos ensopados até os ossos (e câmeras; a minha pifou) filmando a grande marcha organizada por Long Hair, uma das personagens mais carismáticas do filme. Dias loucos. Em 96 horas, mais da metade rodando sem parar, Long Hair participou de nove protestos, cinco sessões no parlamento e trocou de roupa umas duas vezes. Uma camisa de Che por outra, claro.

Chita, o imortal

O macaco do Tarzã ataca outra vez

(ilustração de Andrés Sandoval; publicado na piauí 32)

No dia 9 de abril, ao sentar-se à mesa do jantar, o macaco Chita se animou com o bolo coberto com marshmallow e chantilly. Era dietético, para diabéticos como Chita. Percebeu, em seguida, que não estava só. Na pequena sala branca, decorada por telas abstratas de sua autoria, havia mais de vinte pessoas - entre elas, repórteres de tevês americanas e alemãs. Chita não ligou para a tropa, assim como não deu muita bola para o cone colorido de papelão que vestia na cabeça. Chita estava acostumado a essas coisas. Com certa nonchalance, tascou uma dentada no doce, e o bote foi registrado instantaneamente por um sem-número de flashes. Era seu aniversário. O 77º.

Enquanto tratadores, cinéfilos e talvez até os chimpanzés do mundo celebravam esse feito de longevidade, o jornalista Richard Dean Rosen lamentava mais um ano de ilusões coletivas na história do cinema: "As pessoas precisam de ídolos. Eu mesmo ignorei, por um tempo, os indícios de que não havia um Chita original." Contratado em 2007 para escrever a biografia do primata, Rosen quase enterrou o mito. Antes de suas pesquisas, rezava a lenda que, em 1932, nos cafundós da África, Chita fora separado da mãe. Ainda bebê, migrara da Libéria com seu futuro tratador, Tony Gentry. Chegara aos Estados Unidos a bordo da Pan Am, companhia aérea à qual Chita teria sobrevivido com décadas de vantagem.

Aos 5 anos, já acostumado ao clima seco e temperado de Hollywood, Chita, que ainda se chamava Jiggs, teve sua grande oportunidade na terra do cinema: o convite para atuar num filme de Tarzã, ao lado do ex-campeão de natação Johnny Weissmuller. Como tantos atores que fazem sucesso em seu primeiro papel, Jiggs mudou de nome e passou a ser tratado de Chita. Era uma época de ouro para os primatas de Hollywood, que gozaram de prestígio até o final dos anos 40. Passados os anos, e descrente do futuro de Tarzã, Weissmuller abandonou a carreira de Rei das Selvas e foi vender piscinas pelo país adentro. A Chita restou o ostracismo que enxota dos estúdios os chimpanzés com mais de 10 anos, quando se tornam adultos, mal-humorados e perigosamente mais fortes do que os humanos com que contracenam, sejam eles Tarzã ou não. Passou a viver exclusivamente da caridade de Tony Gentry - que, ao adoecer, em 1990, passou sua guarda ao sobrinho Dan Westfall, também amestrador de Hollywood.

Na casa nova em Palm Springs, Califórnia, Chita e Westfall se deram bem. O novo agente diagnosticou seu diabetes, tratado, até hoje, com duas injeções diárias de insulina. Mudou-lhe a dieta, retirando a cerveja, o chocolate e os ovos com bacon que lhe serviram de combustível na ascensão ao estrelato e na conversão em americano da gema. E investiu na fama pregressa de Chita. Primeiro, erigiu uma estátua de bronze do macaco em seu jardim. Depois, transformou a casa em museu de ex-estrelas, batizada com a sigla CHEETA, juntando o nome artístico do chimpanzé - que por lá se escreve com "ee" em vez de "i" - com a razão social de sua empresa, a Creative Habitats and Enrichment for Endangered & Threatened Apes. Ou seja, "Habitats Criativos e Enriquecedores para Primatas Ameaçados & em Perigo".

Investiu, também, numa segunda carreira para o macaco. Chita é hoje um pintor de relativo sucesso no mercado de arte internacional, com cerca de mil obras espalhadas pelo mundo. "Umas 15 no Brasil", Westfall afirma. São quadros abstratos, algo simples e meio parecidos entre si, como convém à obra de um artista que encontrou seu espaço entre colecionadores e não pode sair por aí, inventando coisas que só servem para confundir os marchands. Oficialmente, a obra de Chita não é vendida. Mas o tratador aceita doações para a causa dos primatas criativos ameaçados ou em perigo. Cada tela sai em média por 200 dólares.

Sempre atento às brechas mercadológicas, em 2001 Westfall conseguiu que Chita, aos 69 anos, fosse reconhecido como o macaco mais longevo do mundo pelo Livro dos Recordes. E não foi só. Sendo um poço de idéias, certo dia, diante de uma livraria, Westfall teve outra inspiração. Se Arnold Schwarzenegger, Monica Lewinsky e Paris Hilton tinham suas próprias biografias, por que o seu primata não mereceria essa honra? Apostou numa autobiografia, escrita por ghost-writer, mas assinada por Chita. E convidou para a parceria literária com o macaco o jornalista nova-iorquino Richard Dean Rosen.

Rosen é um primata investigativo do gênero repórter. Bastou-lhe um mês de convivência com o tema para se intrigar com um detalhe do currículo de seu biografado. O primeiro vôo transatlântico havia ocorrido em 1927, no bimotor de Charles Lindbergh. "Me perguntei: será que em 1932, ano em que Chita chegara aos Estados Unidos, já havia vôos comerciais entre os dois continentes?" Rosen verificou. Os vôos tinham começado em 1939. Sete anos depois da decolagem de Chita para a fama.

E como explicar que o animal tenha aparecido jovem e garboso em Tarzã, o Homem Macaco, nos anos 30, e ainda em plena forma para contracenar com o ator Rex Harrison em O Fabuloso Doutor Dolittle, nos anos 60? Rosen investigou duas hipóteses - ou o chimpanzé mentia a idade descaradamente ou era um fenômeno de longevidade, mas não um grande ator aposentado. Armado com uma fotografia do perfil de Chita, que o identificava de maneira conclusiva pelas dobras da orelha, passou "horas, dias, semanas" procurando a estrela primata nos velhos filmes que tinham macacos no elenco. "Se ao menos eu conseguisse provar que o meu Chita participou de algum filme, um só já bastava..." Não conseguiu. A história do cinema não registrava um único fotograma com o seu Chita. Era preciso dizer o impensável: este Chita era um embuste.

Rosen marcou entrevistas com velhos amigos de Tony Gentry, o inventor do macaco e da história. "Eles chegaram a rir de mim. Não era segredo que Gentry às vezes aumentava as histórias." Concluiu que aúnica coisa que ligava Chita às estrelas de cinema era a idade indeterminada. O macaco poderia ter 74, 62, 61 ou, mais provavelmente, 49 anos - o que é uma complicação insolúvel para quem está às voltas com a biografia autorizada de uma lenda viva. Deu a triste notícia a Westfall que, inconsolável, desistiu do livro. Rosen acabou dono de "uma sacola de verdades que não interessa a ninguém". Muito menos a Chita, que não pensa haver vida sem bolo em festa de aniversário.

Desce!

Altos e baixos de uma classe obsoleta

(ilustração de Andrés Sandoval; publicado na piauí 32)

A argumentação até que é sólida: "Os elevadores modernos são projetados para o uso automático. Todo o bom funcionamento do sistema depende da não-interferência humana."?A justificativa do projeto de lei aponta que, do jeito que está, há um "aumento dos custos com a mão-de-obra" e também uma "diminuição da capacidade em, pelo menos, uma pessoa". Se algum leitor ainda não se deixou convencer, o documento dá o golpe de misericórdia, encerrando a prosopopéia com um argumento capaz de sensibilizar qualquer alma que já tenha perdido preciosos segundos à espera do proverbial passageiro Rexona: "A eliminação do atendimento automático" - em outras palavras, a presença do ascensorista - "provocaria, entre outras consequências, a demora no fechamento de portas para atender a retardatários visando a uma maior lotação antes de dar a partida."

É assim, com juízos técnicos, lógica cartesiana e português claudicante, que o projeto de lei nº 3738/2006, aprovado pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, vai em breve extinguir o cargo de quase 4 mil profissionais no estado. Adeus ascensoristas. Segundo o texto proposto, apenas os edifícios não residenciais com elevadores controlados à manivela - uma multidão, como se sabe - terão que continuar utilizando os serviços da classe. Para os outros, vai ao gosto do cliente. Ou do condomínio.

"Será que eles não ouviram falar em 'crise econômica' pra propor uma coisa assim numa hora dessas?", pergunta com indisfarçável indignação Máximo, ascensorista cujo nome não é este - a seu pedido, resguarda-se sua identidade para protegê-lo de represálias do condomínio no bairro do Flamengo, onde trabalha. Chegamos a este ponto. "Está todo mundo falando em política para gerar emprego e vem esse cara para cima da gente?", vitupera.

Esse cara, no caso, é o deputado Luiz Paulo Corrêa da Rocha, do psdb, ex-vice-governador de Marcello Alencar, ex-candidato a vice-prefeito na chapa de Fernando Gabeira, e atual corregedor da Assembléia Legislativa do estado. É dele o projeto funesto que feriu de morte o artigo da lei de 1991 que obrigava prédios não residenciais a utilizarem ascensoristas. Sem dúvida, 1991 foi o annus mirabilis desta classe nascida de mãos dadas com os arranha-céus. Naquele memorável começo de década, o então governador Leonel Brizola aprovou a criação do Dia do Ascensorista, celebrado em outubro.

Em março de 2006, a classe deveria ter desconfiado que nuvens carregadas começavam a cobrir o céu rosáceo de 1991. De forma insidiosa, o mal chegou vestido em pele de cordeiro. Naquele mês, a governadora Rosinha Garotinho decretou que, dali para frente, todos os ascensoristas teriam direito a uma cadeira ergonômica que lhes aliviasse a lombar, tão maltratada pelo sobe-e-desce constante. Obcecado pelo tema, o deputado Luiz Paulo não tardou em agir. Defensor ardoroso da tecnologia de ponta e do melhor uso dos espaços, julgou que cadeiras parasitando no canto de cabines quase sempre exíguas eram evidência incontestável de retrocesso. Nove meses depois, entrou com um pedido de modificação da lei. Argumentou que a "cadeira do ascensorista, junto da porta" provocaria uma "maior dificuldade para o entra-e-sai dos passageiros". Após dois anos de lenta tramitação, no começo do último mês o projeto foi incluído na ordem do dia. Deve ser assinado em breve pelo governador Sérgio Cabral. O deputado Luiz Paulo foi sagaz: aproveitou que estava eliminando a cadeira ergonômica e, zás-trás, eliminou também quem se sentava nela.

"Estão dizendo que os elevadores fazem tudo, que falam e o caramba. Mas e o deficiente? E quem tem medo? E quem não sabe aonde vai? E quando dá pane? E os que depredam? Acho que tem coisa por trás disso", diz o ascensorista Sérgio Barbosa, presidente do Sindicato dos Cabineiros de Elevador do Município do Rio de Janeiro, que não pediu anonimato por não temer a fúria de condomínios. "Você viu como o pessoal do Secovi estava juntinho no lance da comemoração da lei?", pergunta.

Secovi é o sindicato que congrega condomínios e administradoras de imóveis do Rio de Janeiro. Em abril, seu presidente, Pedro Wähmann, respondeu aos repórteres que lhe perguntavam sobre as consequências sociais do projeto de lei. Explicou: "Não está se suprimindo posto de trabalho. Aquele equipamento já foi criado para funcionar sem o operador humano."

O projeto de lei não foi a primeira "dobradinha" entre Luiz Paulo e Wähmann. Em janeiro de 2007, o deputado propôs à Assembléia que o Secovi, representado por seu presidente, fosse agraciado com a Medalha Tiradentes, honraria destinada a quem contribui substancialmente para a causa pública do estado do Rio de Janeiro, como a cantora Daniela Mercury e o Papa Bento xvi, homenageados em 2005. O próprio Luiz Paulo espetou o galardão na lapela de Wähmann.

À rotina tediosa dos ascensoristas junta-se, agora, a incerteza quanto ao futuro. A classe compareceu em peso à passeata organizada pela União Geral dos Trabalhadores no dia 1º de maio. Barbosa, do Sindicato dos Cabineiros, muniu-se de duas faixas e do abaixo-assinado que espera entregar ao governador Sérgio Cabral. Só não pôde contar com o apoio dos ascensoristas que trabalham na Assembléia. Os elevadores da casa, de 1926, são todos a manivela.

14.5.09

Bem-vinda, gatinha

11.5.09

Rá-rá-tá-tá


Revolución, história, games e Che: o blog Que planeta generoso traz a história de um jogo eletrônico que dizia hasta la victoria siempre!

30.4.09

Realismo e artifício

Há tempos não leio um artigo provocativo como esse de Ted Gioia. Seu argumento básico, colocado de forma clara e limpa, é que a crítica e a chamada boa literatura se alimentam do realismo, enquanto o que continua – "continua" porque assim era por boa parte da história das narrativas – mobilizando as mentes de leitores do mundo todo são obras que devem muito mais ao fantástico e o irreal.

Estou simplificando terrivelmente suas idéia, portanto peço que você se dirija ao texto (em inglês) e leia por você mesmo um conjunto de idéias que pede uma revisão completa do que se considerou bom e ruim no século vinte e junte ao panteão onde repousam experiências de linguagem (bem quistas até hoje, e nada contra) livros considerados popularescos, ruins, pulps, pops e rasos. Gioia não entra na lógica de "bom" e "mau", apenas observa – e ele está inegavelmente certo – que não há dúvidas de onde está o amor dos leitores: na fantasia.

(A propósito, ele lista uma "biografia fantástica" bastante ampla (e, para alguns, herética) que junta Saramago, García-Márquez, Harry Potter e o Crash, de Ballard; delicioso)

Gioia também faz pedaços de nomenclaturas inadequadas como ficção científica, algo que muito me interessa, porque se conecta intimamente com a ideia do que quero que seja meu próximo filme. Nele, vemos um Brasil que se tornou uma potência mundial graças à invenção de uma pílula que garante a imortalidade por vinte anos, mas exige que seus usuários a renovem, ou então enfrentarão uma morte dolorosa. O protagonista do roteiro é precisamente um homem fracassado, na pílula há décadas, que não tem dinheiro para a renovaçnao e, portanto, está marcado para morrer. A trama se desenrola exatamente sobre o que esse homem será capaz de fazer para permanecer vivo.

Agora a pergunta: isso poderia ser chamado de ficção científica? Não, na minha opinião, mas esse tem sido o rótulo usado por muita gente para descrever a ideia. Sempre foi uma forma que me pareceu muito incômoda. Seria o mesmo que chamar, por exemplo, Admirável mundo novo ou Brilho eterno de uma mente sem lembranças de ficção científica.

Gioia toca nesse ponto em seu ensaio: a ciência geralmente é apenas uma forma de saltar para o mundo imaginado, e no mais das vezes é também ela imaginada e falsa. Vou adiante: num mundo moderno, onde não há deuses e forças superiores críveis, há que se apelar à única coisa em que o homem moderno realmente se curva: a ciência. Na verdade, a ciência é apenas um caminho para forçar, arbitratriamente, a verossimiliança da história.

28.4.09

No planeta Gatopardo

Acaba de sair no México o livro Crónicas de otro planeta, que reúne 22 reportagens publicadas nos últimos anos pela revista Gatopardo, decana das publicações de jornalismo literário na América Latina. No livro há um texto meu, "Desenterrando al Che", que vem muito bem acompanhado por contribuições de gente que escreve de verdade, como o uruguaio Leonardo Habekorn e o mexicano Fabrício Mejía Madrid. Na entrevista abaixo, concedida a León Krause da ótima Letras Libres, o editor Guillermo Osorno comenta os eixos que nortearam a seleção do livro, que pode ser comprado na Gandhi ou na MuchosLibros, ambas mexicanas.

25.4.09

Che volta a São Paulo

Boas novas: Personal Che foi selecionado para abrir outra mostra, a tradicional retrospectiva de melhores de 2008 organizada pelo Sesc de São Paulo. Che foi um dos cinco docs na seleção de 52 filmes, junto com títulos como Pan cinema permanente, de Carlos Nader, Serras da desordem, de Andrea Tonnacci, e Sicko, de Michael Moore.

O filme volta a passar dia 28, às cinco da tarde, no CineSesc, na Augusta.

23.4.09

Maricá desrespeita a Revolução Cubana

Não há muito mais a comentar quando o título é esse. Vai mais um trecho:

"Para irritar ainda mais o médico argentino Ernesto Che Guevara, Maricá possui um desastroso atendimento médico, um único prédio hospitalar mal equipado, aos cacos, com atendimento ineficiente. Nem a campanha de vacinação do idoso, que começou há uma semana em todo país, sequer foi anunciada aqui. Para deixar mais furioso o companheiro Che, o governinho maricaense pouco pensa em cultura e educação, mas adora aparecer em reuniões ou dar festa."
A coisa está toda aqui.

21.4.09

Ache uma poltrona



O Youtube finalmente abriu sua seção de documentários. Provavelmente o movimento em direção de conteúdo profissional é um aceno para os anunciantes que realmente podem bancar os altos custos do site, mas fogem do último tombo do vizinho filmado no celular. Tem diversas coisas bacanas, especialmente do Herzog: Little Dieter needs to fly, Meu melhor inimigo, o impressionante Lessons of darkness, enquanto que de ficção há Kaspar Hauser, Aguirre, Fitzcarraldo e outras coisas muito finas. Mas não para por aí: fuçando encontrei coisas boas como A revolução dos bichos, do Orwell, Abre tus ojos, do Amenábar (infelizmente bloqueada para o Brasil) e um desconhecido Do you like Hitchcock, dirigida por ninguém menos que Dario Argento. O Youtube até pergunta se você tem certeza de quer ver.

Se tiver, é só dar play aí em cima.

17.4.09

No Rio e em Mineápolis



Boas notícias: Personal Che está de volta às telas do Rio depois de alguns vôos rasantes nas últimas semanas – uma sessão MovieMobz e a presença nas retrospectivas de melhores de 2008 da CPLP e, agora, do CineSesc. O filme vai ficar a partir de hoje até quinta que vem em um só horário no Cine Glória (que aliás tem uma ótima programação que você pode conferir aqui). É a chance para quem não viu.

Além de visitar as praças já conhecidas, o filme chega também a mais um festival nos Estados Unidos: o de Minneapolis-Saint Paul. O filme passa nos dias 23 e 27, para quem estiver de passagem, e os horários estão aqui.

16.4.09

Che bailante!

É isso mesmo, um musical sobre a vida de Che estreia na Argentina com estardalhaço. Tem até um blog cheio de fotos de bailarinas suadas se contorcendo. Nada mal. Tem gente dizendo, inclusive, que o polpudo apoio monetário da Casa Rosada é pra atrair a esquerda cada vez mais distante dos Kirshner.

Isso eu não sei, mas sei que um musical sobre a vida do Che já foi encenado com orquestra, dezenas de bailarinos e explosões há três anos – e no Líbano!



Atualização: a BBC pôs em seu site um vídeo do musical.

12.4.09

Ebenezer Obey e seus amigos

Meu bom amigo DJ/sound designer/músico/produtor Ricardo Cutz tinha me passado o link para o Awesome Tapes from Africa há um bom tempo, mas nunca tinha mergulhado. O link ficou numa gaveta perdida. Ontem dei de cara com ele de novo numa matéria da Folha sobre música africana. Voltei e gamei: site pra baixar loucamente milhares de fitas K7 safadas da melhor qualidade, garimpadas por um americano malucão e apresentadas (às vezes) com comentários bastante elucidativos.

Quase nada de folclore aqui: hiphop de várias partes, juju music, high life, música gnawa do Marrocos (pra quem gosta de samba) e muito rock e blues do Mali – o país com a melhor produção dos dois gêneros, hoje, na minha modesta opinião. E você ainda leva de brinde capas com figuraças como Ebenezer Obey. Tem erro?

5.4.09

Che no Rio



Chegando tarde ao blog, mas já devidamente anunciado alhures: hoje, domingo, cinco de abril, tem sessão de Personal Che às 8:30 da noite no Cine Odeon BR, Cinelândia, Rio de Janeiro. A sessão foi mobilizada através do site MovieMobz.com. Achei tão legal que apareço lá pra conversar com quem quiser saber mais coisas do filme.

A foto vai em homenagem ao Long Hair, que acabou de fazer aniversário quase indo (de novo) em cana por conta dos seus protestos contra a China.

29.3.09

Parede



Esse é só um dos bonitos cartazes de banda/show do bacana Posterize.

28.3.09

Gente do carnaval








25.3.09

Fornicando


View Larger Map

Tirem as crianças da sala que o post é para maiores.

O que o digno leitor vê aí acima é nada mais, nada menos que um mapa de alguns bordéis em funcionamento no Rio de Janeiro... de uns cem anos atrás. Além disso, aparecem em azul algumas ruas particularmente suculentas, tais como registradas na crônica policial de então e compiladas atentamente pela pesquisadora Lena Medeiros de Menezes em seu Os estrangeiros e o comércio do prazer nas ruas do Rio (1890-1930). Não é nada científico – faltam diversos bordéis, por certo, a posição de sua numeração na rua pode ter mudado com os anos e sequer incluí ruas em que não consegui descobrir o nome novo.

Ainda assim, é um mapa onde ficamos sabendo que a Grampeadores e Grampos, na Luís de Camões 112, já fez coisa muito mais interessante e que a Termas Rio Antigo faz jus ao nome: há venda de pecado lá desde ao menos 1920 e poucos. A cidade subitamente ganha um ar mais licensioso.

Para quem estranhar as menções também a cemitérios, sinagogas e etc, vai a explicação: o mapa faz parte de uma pesquisa que faço para a documentarista argentina Gabriela Bohm, que vem ao Brasil em breve para as primeiras filmagens do seu Garotas da noite, filme sobre o aliciamento de judias do Leste Europeu por uma tentacular gangue de cafetões judeus a partir da virada para o século 20. Em certo momento, a Zvi Migdal chegou a administrar 3.000 bordéis no Rio, Buenos Aires, Nova York e outras capitais do mundo. As polacas criaram associações religiosas e funerárias próprias e deixaram rastros na criação de artistas tão díspares quanto Lasar Segall, Stefan Zweig e Moreira da Silva. Em breve mais.

13.3.09

Mais uma chance

Quem tiver perdido Personal Che nos cinemas tem mais uma chance de ver o filme na próxima semana em São Paulo. Ele integra a pequena Retrospectiva Doc 2008 que a CPFL organiza na capital paulista e também em Campinas. A curadoria de Amir Labaki garantiu ótima companhia: Pan Cinema Permanente, de Carlos Nader, O advogado do terror, de Barbet Schroeder, Joy Division, de Gant Gee, O tempo e o lugar, do mestre Eduardo Escorel, entre muitos e bons outros. Labaki fala um pouco da retrospectiva na sua coluna. Às datas:

Quarta 18, no Reserva Cultural (Av. Paulista, 900)
• Sexta 20, no CPFL Cultura de Campinas (Rua Jorge Figueiredo Corrêa, 1932)

A mostra continua na semana seguinte, com filmes de ficção que ficaram pouco tempo em cartaz. Injustamente, diga-se: há pérolas como Encarnação do demônio, de José Mojica Marins, Falsa Loura, do Carlão Reichenbach, e o acachapante Serras da desordem, de Andrea Tonacci. A agenda completa está aqui.

Em breve, aqui no blog, notícias televisivas de Personal Che.

1.3.09

Ressuscitando


O blog volta das cinzas do olvido, tal como fênix, tal como Che Guevara, redivivo quando se precisa!

Sai hoje no O Povo, do Ceará, reportagem sobre Che por conta do lançamento próximo do filme duplo de Steven Sodererbergh sobre o guerrilheiro. Fui convocado pelo repórter Henrique Araújo a palpitar sobre o filme e quem é, afinal, esse argentino que Benício del Toro encarna.

O resultado está aqui.

27.1.09

Desencavando

O blog anda meio parado por conta da loucura de aprontar meu roteiro para o Festival de Berlim (mais detalhes em breve), então aproveito a aprovação da Constituição Moraleista na Bolívia esse domingo para desencavar uma conversa que tive com Morales dias antes da eleição que o consagrou como presidente.

É sempre bom lembrar que ele prometeu confusão desde o início. Cumpriu sua palavra.

"Evo Morales está de tênis, jaqueta pesada de couro e o topo de sua cabeça é um formidável capacete de cabelo índio muito negro. Parece um pouco tenso. Fala baixo ao celular meio remendado olhando pela janela da sacada os muitos repórteres que o esperam no saguão do hotel e, por cima do próprio ombro, uns poucos que estão mais perto, apenas alguns degraus abaixo."
O resto – inclusive um entrevero com o entonces casi flamante líder boliviano – você lê aqui.

12.1.09

فلسطين

Já se vão sete anos da época em que trabalhava no JB e cobria, principalmente, Oriente Médio. Uma das matérias de que mais me orgulho saiu pequena, contava com poucas fontes, fontes de um lado só, e não falava de nada especialmente importante politicamente. Era sobre o cerco israelense a Ramala, cidade mais importante da Cisjordânia.

Apesar de achar o título melodramático (o meu era outro) ainda teria orgulho de escrever essa matéria hoje. O grande problema é que o mundo conseguiu torná-la obsoleta: morreu comparativamente pouca gente nessa ocasião. A matéria, salvo engano, não noticia mortes, mas uma agoniada espera.

Em 2002, fez-se um grande escândalo sobre um massacre ocorrido na cidade palestina de Jenin, na Cisjordânia. Em seguida, formou-se outro escândalo quando se descobriu que o massacre não tinha sido tão grande. O primeiro movimento foi dizer que o Exército israelense exagerou na resposta. O segundo, dizer que a imprensa exagerou na reação.

Pois bem: desde o início da ofensiva a Gaza já morreram, comprovadamente, mais do dobro de palestinos mortos nos rumores que davam conta de Jenin. A realidade suplantou um exagero espetacular.

É difícil pensar que não estamos nos acostumando a isso.

7.1.09

Ajude-me a matar (uma personagem)

Sim, é mórbido. Sim, é humor negro tão poucos dias depois do Ano Novo com todo mundo de branco. Que fazer? Meu protagonista precisa assassinar várias pessoas e minha cabeça está longe de ser criativa para tal tarefa. Portanto... alguém se habilita a fazer sugestões nos comentários desse post?

Serve qualquer morte, desde que seja criativa e não pareça natural: cordas, tiros, facas, etc são muito fáceis, mande apenas se achar a idéia MUITO boa. Para uma idéia, minhas últimas duas da lista são com um estouro de cavalos e pelo ataque de abutres.

Tente não plagiar mortes de personagens da ficção. Tente fazer mortes baratas. Mortes executáveis por um homem só. Mortes de época não valem. Mortes divertidas são benvindas.

As melhores sugestões vão para o roteiro. Se tudo der certo, esse roteiro vira um filme. E, nesse filme, garanto seu nome nos créditos.

2.1.09

Ideias em tiras

Pouca gente ainda tem dúvida de que histórias em quadrinhos podem ser arte. Estão aí Frank Miller e Will Eisner que não me deixam mentir (bom, Eisner já não está, infelizmente, mas você entende...) Mas para mim mesmo ainda não era claro o quanto os quadrinistas especializados em tirinhas andam ambiciosos. Quem sabe esqueci do Little Nemo, sei lá, mas era só falta de enunciar mesmo, porque na prática a sessão de tiras da Folha já é a que recebe minhas visitas com mais frequência. Hoje, por exemplo, achei os quatro quadradinhos do Caco Galhardo o que de mais apropriado se pode dizer desses dias:




Mas é o Angeli quem fez o mais bonito, o mais cabeça, o que merece mais tempo – embora não exija – para ser (ai, ai, ai) fruído.



O roteiro parece não ser nada demais. Mas o uso da cor lança o sentido para o alto, muito alto. "Roteiro"? "Uso da cor"? Sim, sim, é de arte que se fala.

PS: Esse post (acho), seguiu as normas do novo acordo ortográfico da língua portuguesa. Mas não se acostume :-)